Estadão: ‘Toffoli parece profundamente empenhado em reescrever a história de corrupção do PT’

Jornal afirma que magistrados do STF deveriam agir para impedir ‘cruzada revisionista’ do colega

Em editorial publicado na edição desta quarta-feira, 7, o jornal O Estado de S. Paulo critica a avalanche de decisões do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Dias Toffoli para liquidar os resquícios da Operação Lava Jato.

A mais recente canetada do ministro foi para determinar que a Procuradoria-Geral da República (PGR) retome uma investigação sobre um suposto conluio entre a ONG Transparência Internacional e a Lava Jato para se apropriar de recursos recuperados de esquemas de corrupção.

Estadão lembra que essa investigação já tinha sido encerrada em 2020 por falta de provas, e agora, depois de ter sido criticado pela ONG, mas sem nenhum fato novo sobre o suposto conluio, Toffoli mandou reabri-la.

“Não se conhecem os motivos do ministro Toffoli, que de resto parece profundamente empenhado em reescrever a história de corrupção e desmandos que marcaram a trevosa passagem do PT pelo poder”, critica o jornal, acentuando a conduta revisionista e, por consequência, revanchista do ministro. “Fica claro, no entanto, que o ministro não se sente constrangido de nenhuma maneira, nem pelas normas mais comezinhas do Estado Democrático de Direito, em seu empreendimento revisionista — que, como todo bom revisionismo, vem carregado de ânimo vingativo.”

A ONG Transparência Brasil incluiu no relatório sobre a percepção da corrupção — no qual o país caiu 10 pontos em 2023 — a atuação de Toffoli como um dos motivos para a queda. Desde setembro, o ministro, ex-advogado do PT, vem concedendo decisões em série a favor dos investigados.

Em uma delas, anulou todas as provas obtidas no acordo de leniência com a Lava Jato. Em 20 de dezembro e 31 de janeiro, Toffoli suspendeu a cobrança de multas à J&F e à Odebrecht, duas empresas que admitiram pagamento de propina nos governos do PT.

Sobre a “reação truculenta” de Toffoli de determinar a reabertura da investigação da ONG, sem nenhum fato novo, o Estadão diz que “não se pode condenar quem veja na ordem exarada pelo ministro Dias Toffoli à PGR uma espécie de retaliação, o que não se coaduna com a judicatura”.

Ministros do STF deveriam parar cruzada revisionista de Toffoli, diz Estadão

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Estadão diz que nada sugere que os pares do ministro Dias Toffoli vão agir para frear o colega; sessão de abertura dos trabalhos do Judiciário – 1/2/2024 | Foto: Ton Molina/Estadão Conteúdo

Para o jornal, é preciso que os demais ministros STF parem Toffoli, embora isso não seja muito provável. “Resta esperar que o colegiado da Corte ponha termo a esse empreendimento, mas nada sugere que os pares do ministro Dias Toffoli o farão, pois tudo indica que estamos diante de um fato consumado.”

“A decisão de apagar a Lava Jato da historiografia do País parece que já foi tomada. É muitíssimo improvável que Dias Toffoli esteja tomando as decisões que tem tomado sobre os acordos de leniência firmados no âmbito da Lava Jato desde setembro do ano passado, decisões estas extremamente sensíveis, sem a anuência presumida de uma maioria confortável de seus colegas. É urgente, portanto, que o Supremo se pronuncie o quanto antes sobre esses casos como o tribunal colegiado que é”, avalia o Estadão, afirmando que Toffoli faz uma “cruzada revisionista”.

‘Amigo do amigo do meu pai’ e a suspeição de Toffoli

Marcelo Odebrecht
Empresário Marcelo Bahia Odebrecht | Foto: Giuliano Gomes/Estadão Conteúdo

Estadão lembra que Toffoli, se a legislação brasileira estivesse sendo seguida, nem ao menos deveria ser o relator dos casos que envolvem a Lava Jato, especialmente da Odebrecht e da J&F. O ministro foi citado em documentos internos da Odebrecht. Em manifestação enviada por Marcelo Odebrecht à Polícia Federal, Toffoli foi mencionado como sendo o “amigo do amigo de meu pai”, em referência ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao pai do empresário, Emílio Odebrecht. Não bastasse isso, a mulher do ministro, Roberta Rangel, é advogada do Grupo J&F.

“Estivesse o País menos bagunçado moral, ética e institucionalmente, o ministro teria se declarado impedido — ou ao menos sua permanência nesses processos provocaria mais espanto”, critica o Estadão.

O jornal finaliza ao afirmar que, ainda mais escandaloso que o conflito de interesses, “é o estado de letargia dos pares do ministro Dias Toffoli no STF, que assistem a esse assalto monocrático a tudo o que há de minimamente ético e republicano no exercício do múnus público em nome de interesses para lá de obscuros”.

*Fonte: Revista Oeste