CASO ZAMPIERE – No Whats, advogado manda foto de ouro a desembargador; CNJ vê corrupção

Zampieri mandou imagem de 400 gramas de barra de ouro

A decisão do ministro corregedor Luis Felipe Salomão, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que determinou o afastamento de dois desembargadores do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), revela que o advogado Roberto Zampieri, assassinado em dezembro de 2023, teria enviado fotos de barras de ouro a um dos magistrados. O togado, inclusive, teria manifestado seu descontentamento em uma das conversas interceptadas e que estavam no aparelho de celular do jurista.

Foram alvos da decisão os desembargadores João Ferreira Filho e Sebastião de Moraes Filho e o afastamento teria sido motivado por conta de informações contidas no telefone celular que pertencia ao advogado Roberto Zampieri, por suspeita de venda de sentença. Em uma das conversas interceptadas, o jurista chegou a enviar fotos de barras de ouro.

O diálogo flagrado envolve o advogado e o desembargador Sebastião de Moraes Filho e data de meados de outubro do ano passado. No dia 15 daquele mês, Zampieri encaminhou fotos de duas pequenas barras de ouro.

De acordo com o documento do CNJ, trata-se de um indício forte de que o jurista oferecia vantagens indevidas ao desembargador. Após o envio das fotos, o magistrado passa a procurar, com uma grande frequência, o jurista.

“A partir deste dia, inicia-se uma sequência de diálogos entre os interlocutores que reforçam as suspeitas de que o falecido advogado, de fato, oferecia vantagens indevidas ao magistrado. Trata-se de período em que o reclamado [desembargador], inicialmente, estava em mais uma viagem internacional, mantinha conversa amigável com Roberto Zampieri – como de costume – e lhe lembrava do dia em que retornaria, enfatizando, mais de uma vez: ‘não esqueça’”, aponta a decisão. Para o CNJ, a insistência do desembargador seria um indício forte de que se tratava, na verdade, de algo do interesse do magistrado e não do advogado.

Em um trecho da conversa, Sebastião de Moraes Filho diz que precisava falar com Roberto Zampieri com uma certa urgência, mas o jurista estava em Goiânia, em um julgamento, tendo respondido que voltaria no dia seguinte. Já no dia 21 de novembro, poucos dias antes de Zampieri ser assassinado, o desembargador relata que o advogado o estaria colocando em uma situação complicada.

Posteriormente, o magistrado demonstrou descontentamento pois, aparentemente, teriam agendado uma reunião na qual o jurista não compareceu. “Estou na espera do memorial para analisar. Estou no gabinete aguardando o senhor. Tá me colocando numa sinuca de bico. Três dias depois, Sebastião manda a Zampieri uma figurinha (sticker) de um homem furioso, aparentando estar descontente com o advogado. Pelo teor da conversa, é possível inferir que o magistrado esperou o advogado no Tribunal e este não compareceu, motivo por que combinaram de se encontrar na segunda-feira seguinte”, aponta o documento do CNJ.

Ao final da conversa, Zampieri envia fotos de duas barras de ouro ao desembargador, que questiona se tratava-se de 500 gramas. O advogado respondeu que eram 400 gramas e, então, marcaram de se encontrar numa segunda-feira, que seria aniversário do magistrado.

Para o CNJ, a conversa sugere um cenário de comprometimento de Sebastião de Moraes Filho. “Os elementos de prova até aqui colacionados foram extraídos, exclusivamente, dos diálogos entre o advogado e o desembargador. Por si só sugerem, fortemente, um cenário de gravíssimo comprometimento da imparcialidade, integridade e independência do magistrado frente às investidas do advogado falecido, inclusive, possivelmente, com recebimento de vantagens indevidas por parte do desembargador, em benefício próprio e de seus familiares”, completa o documento.

O CASO

Roberto Zampieri foi assassinado a tiros na noite do dia 5 de dezembro na frente do próprio escritório no bairro Bosque da Saúde, região nobre da Capital. Ele estava dentro de uma picape Fiat Toro quando foi atingido com diversos tiros de pistola calibre 9 milímetros disparados pelo pedreiro e pistoleiro, Antônio Gomes da Silva, de 56 anos. Ele foi preso na cidade de Santa Luzia, região metropolitana de Belo Horizonte (MG) e atualmente está detido numa unidade prisional de Cuiabá.

Em junho, em uma manifestação onde foi negado um pedido de devolução e destruição dos dados contidos no aparelho celular do advogado, o CNJ apontou que uma decisão do desembargador Sebastião de Moraes Filho, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) teria sido o motivo para a morte do jurista. O imbróglio judicial se deu por conta de uma disputa envolvendo uma área de 4,5 mil hectares, avaliada em quase R$ 6 milhões.

Segundo as investigações, o médico veterinário Aníbal Manoel Laurindo, que é fazendeiro e empresário, sua esposa Elenice Ballarotti Laurindo, e também o irmão dele, José Vanderlei Laurindo, estavam envolvidos numa disputa de terras contra um cliente de Roberto Zampieri, identificado como Jessé Benedito Emídio, por causa de uma fazenda no município de Paranatinga.

A área, no valor de R$ 5,9 milhões, deveria ser repassada ao cliente do advogado. Trechos de decisões mostram o conflito de terras envolvendo as famílias Zampieri e Laurindo. O embate judicial durou vários meses, com desfecho em maio de 2023, quando foi determinada a reintegração da posse da Fazenda Lagoa Azul, de 4.596 hectares que pertencia então a José Wanderlei.

*Fonte: FolhaMax