De acordo com pesquisa, o gasto médio por pessoa foi de R$ 1 mil
O mercado de apostas esportivas no Brasil está elevando o risco de endividamento da população. De acordo com uma pesquisa da fintech Klavi, 30% dos brasileiros recorreram a empréstimos nos últimos 12 meses para financiar suas apostas nas chamadas bets.
A Klavi conduziu um estudo no qual analisou o comportamento de crédito de 5 mil clientes em todo o território nacional. A fintech utilizou seu banco de dados e informações do Open Finance, verificou os extratos bancários dos correntistas, separou outros tipos de gastos e comparou esses dados com os pagamentos efetuados a empresas de apostas.
Perfis dos apostadores de bets que pedem empréstimos
O estudo revelou que o perfil de aposta varia significativamente entre os indivíduos. Entre os correntistas que pegaram empréstimos para apostar, o gasto médio por pessoa foi de R$ 1.113,09. No entanto, alguns apostadores gastam valores muito mais altos.
Para 5% dos apostadores, os gastos com apostas giraram em torno de R$ 4 mil. Em casos extremos, alguns apostadores chegam a desembolsar mais de R$ 50 mil em apostas antes de recorrerem a empréstimos bancários.
Motivações e impactos do estudo
Bruno Chan, presidente e fundador da Klavi, explicou apo portal Terra que a pesquisa foi conduzida em resposta à demanda por informações de grandes bancos e instituições financeiras. Essas empresas desejam entender o impacto das apostas on-line nas finanças de seus clientes e como essa mudança no comportamento de consumo pode influenciar a análise de crédito.
Essa modalidade de jogos foi liberada no Brasil em 2018, quando o então presidente Michel Temer assinou um decreto para autorizar a operação das apostas no país. Desde então, o número de casas de apostas cresceu rapidamente.
Hoje, já existem cerca de 2 mil empresas em operação no mercado. No entanto, esse número deve diminuir significativamente a partir de 1º de outubro, depois de passarem por um processo de regularização para poder operar.
Mercado de apostas no Brasil
A consultoria Strategy & Brasil, da PwC, estima que o mercado de apostas já movimenta R$ 100 bilhões no Brasil. Isso representa quase 1% do Produto Interno Bruto (PIB). “Pegamos 5 mil pessoas aleatórias e analisamos o fluxo de caixa delas, vendo para onde mandam o dinheiro”, disse Chan.
Chan afirmou que a Klavi vai realizar esse levantamento mensalmente para analisar as mudanças e o impacto das apostas on-line no endividamento da população.
“Há muitas empresas de crédito interessadas em entender como as pessoas gastam em apostas e como isso influencia a inadimplência”, afirmou o executivo ao Terra.
Opiniões de especialistas
Pedro Afonso Gomes, presidente do Conselho Regional de Economia de São Paulo (Corecon-SP), disse ao site que o aumento dos empréstimos para financiar apostas se deve à falsa ideia de que é possível multiplicar o dinheiro, como sugerem alguns players desse setor.
“Isso faz com que as pessoas acreditem que é possível mudar suas vidas através do jogo”, disse o presidente do Corecon.
Gomes também acredita que o crescimento do endividamento e da inadimplência que as apostas causam está diretamente relacionado à falta de educação financeira no país. De acordo com ele, isso afeta principalmente grupos de baixa renda.
Outro efeito negativo é o possível encarecimento do crédito em determinados produtos financeiros, pois o setor considera a inadimplência como um fator de precificação.
“O mercado de crédito trabalha na sua precificação dos juros com a inadimplência”, explicou Gomes. “Quanto mais as pessoas se endividam, maior é a chance de elas não pagarem a conta, elevando a inadimplência e pressionando as taxas de juros em determinados segmentos”.
Impactos sociais e financeiros
Além do impacto na inadimplência, o aumento do número de apostadores afeta programas sociais de transferência de renda. Nesta semana, o Banco Central (BC) divulgou que 5 milhões de beneficiários do Bolsa Família enviaram R$ 3 bilhões via Pix para plataformas de apostas.
“O BC está atento ao tema e precisa ainda de mais dados e tempo para avaliar com maior robustez suas implicações para a economia, a estabilidade financeira e o bem-estar financeiro da população”, informou uma nota técnica do BC.
Saúde e educação financeira
Vicente Guimarães, presidente da VG Research, destacou que, no caso de apostadores contumazes, o problema não é apenas a inadimplência, mas também um problema de saúde que pode exigir tratamento especializado.
“Toda vez que a pessoa joga, descargas imensas de adrenalina e dopamina são geradas. Isso gera uma dependência química. Por isso que existem muitos programas de assistência a jogadores compulsivos”, analisou Guimarães.
O especialista também pondera que a educação financeira deve preconizar pelo jogo zero, já que não há, segundo ele, um limite mínimo aceitável para vícios na vida das pessoas.
*Fonte: Revista Oeste